Mountain Farming Fotografia: Bernhard Siegl (Austria) |
Realidade Paralela
Gilberto Strapazon
Gilberto Strapazon
“Sabe-se que nos planos astrais
as formas existentes utilizam nossa energia vital para se manifestar”.
I
O pequeno grupo descia pela encosta. Pela floresta de
pinheiros viam o céu azul. A paisagem
magnífica de grandes montanhas facilmente poderia ser nos Alpes ou quem sabe na
Nova Zelândia.
A temperatura era agradável como a primavera. Aqui e ali
pequenos insetos coloridos voavam.
Uns poucos passos a frente, Gerson caminhava observando os
arredores quando uma leve brisa que veio por trás do grupo trouxe o aroma
inconfundível. Como um sinal de alarme no mesmo instante ele se virou e olhou para os outros três que vinham com uma expressão descontraída.
Bastou um instante de seu olhar para que todos imediatamente
parassem com os olhos varrendo todo perímetro.
Gerson, o líder do grupo, era jovem, no máximo uns trinta
anos. Tinha as feições marcadas de quem já passara por várias situações
diferentes. Algumas marcas nos braços eram lembranças de recentes ferimentos,
todos pequenos.
Olhou para o grupo e falou muito sério:
-Eu não acredito que um de vocês foi peidar logo agora! Quem
foi que fez isto? Esqueceu onde estamos?
Norberto, o terceiro da fila, alto e de cabelos ruivos,
imediatamente respondeu:
-Desculpe Gerson, foi sem querer. Estamos indo tão bem que
eu relaxei e esqueci que a última refeição poderia fazer isto. Aquele assado
estava muito bom!
-Claro que poderia né? Bradou Gerson. Aqui qualquer coisa
pode estragar com tudo. Bem, até agora não vi nada também. Talvez esse lugar
seja neutro também. Bem, quem sabe temos algum tempo ainda. Vamos aproveitar
para aliviar um pouco.
Imediatamente todos deram apenas alguns passos e saíram da
trilha para urinar.
-Não! Todos juntos de novo não! Gritou Gerson, mas era
tarde.
O cheiro da urina fresca já se espalhava com o vento na mesma direção do peido do Norberto.
Ouviram um zumbido leve que vinha da mata logo a frente. As
folhas das árvores brilhavam.
-Corram! Gritou Norberto, mas todos já estavam recuando correndo,
subindo um pouco a encosta e logo descendo entre as árvores. Sempre era melhor
seguir em frente do que voltar por um caminho já trilhado.Eles haviam aprendido que os caminhos sumiam ou mudavam logo que tiivessem saído de vista.
O zumbido parou rapidamente e eles também fizeram uma rápida
pausa para ver o que acontecera.
No lugar onde estavam a pouco, havia uma casa de madeira, o
jardim de flores muito bonitas.
Observaram alguns instantes e voltaram mais relaxados.
II
A casa recém-surgida parecia ter estado ali por décadas.
Muito bem cuidada, janelas abertas mostravam o interior bem decorado e o cheiro
de um bolo no forno convidavam a entrar.
Olharam-se e sem dizer uma palavra, entraram.
A mesa estava servida e eles se espalharam pela casa. Julia
sentou-se à mesa com Gerson e
serviram-se de torradas quentes com manteiga.
Da cozinha veio uma bela mulher, traços nórdicos com uma
bandeja, trazendo o bolo recém-tirado do forno. Começaram a conversar animadamente
sobre as coisas cotidianas. Era tão natural que pareciam conviver diariamente e
todos se conhecessem.Marcos trocava algumas brincadeiras com a mulher na cozinha enquanto pegava uma cerveja na geladeira.
Norberto disse que ia aproveitar para tomar um banho e a
mulher avisou que a roupa dele já estava passada no quarto de cima. Ele subiu e
logo se ouvia que conversava com outra mulher mais jovem no andar de cima. A
conversa era animada e ambos foram rindo para o banheiro.
Luis que por enquanto tinha preferido comer apenas alguns
biscoitos amanteigados vasculhava a estante de livros. Por sinal, os biscoitos
eram deliciosos.
Gerson olhou para ele e disse:
-Luis, quem sabe desta vez algum destes livros possa ter algo sobre
este lugar?
-Bem, é o que tento descobrir. Mas todos os livros sempre
parecem tão comuns. Assuntos gerais,
história antiga, romances. Nada de especial. Já tentei até contar quantas
letras tem nos títulos para ver se tem alguma relação ou se as iniciais formam
alguma sigla, qualquer coisa. Nada! Parece o que encontraríamos em qualquer
livraria ou banca de revista daquelas comuns. A única coisa é que os
personagens retratados, apesar de familiares, não tem nomes que possamos
conhecer. As revistas parecem as mesmas de sempre, mas nalgum outro lugar. Lembram
aquela coleção de vídeos pornô que encontramos na outra vez? Eu poderia jurar
que conheci aquela atriz pessoalmente, mas não lembro donde. Pode ter sido num daqueles programas de entrevista também. Acho que ela foi eleita deputada no país dela.Mas não é a mesma, apenas é algo familiar, como tudo aqui. Olhem os enfeites na prateleira. Não parecem aqueles que sua vó tinha em casa Julia?
Fazendo uma pequena pausa, Julia olhou sobre os óculos, e continuou passando mel numa fatia
de bolo:
-É que você está sempre esquecendo que nem sabemos como
chegamos aqui. Pensa que estamos nalgum buraco qualquer ou fomos
sequestrados. Desta vez tivemos sorte, e
ainda por cima, o Norberto está se divertindo lá em cima. Deu uma piscada para
Gerson que conversava qualquer coisa com a mulher da cozinha:
-Como de costume não é Gerson?
Ambos riram e olharam para a escada. Norberto vinha com ar
satisfeito, o cabelo ainda úmido e uma jovem de seus 19 anos, cabelos também
úmidos, contava sobre o que tinha feito
na semana. Sentaram para lanchar
enquanto os demais cada um a sua vez tomou banho e trocou de roupas.
Era como estar numa pousada, onde todos eram íntimos e se
conheciam.
Mas eles sabiam que não poderiam ficar ali.
A casa era agradável e com uma boa noite de sono, todos
estariam bem no dia seguinte.
Por precaução, fizeram Norberto comer doces que sempre
faziam ele peidar. E todos urinaram do lado de fora da casa antes de deitar. Observaram
algum tempo, mas nenhum som, nenhuma alteração no ambiente ocorreu. Bem, desta
vez a combinação parece ter dado certo.Pena que não poderia ser repetida noutro lugar, a manifestação só acontecia uma vez e não tinha muita lógica. Era como um sonho.
Macalania woods Artista: BloodlineV (Finland) |
A noite estrelada era magnífica. Deviam estar a uns mil metros de altura. A lua
crescente tinha um leve brilho azulado.
Beberam vinho e entre risos e brincadeiras se aconchegaram
sobre a relva.
Seus corpos logo estavam nus e Julia puxou Gerson para junto
de si. As posições variavam e ela logo montou por cima dele, apertando-o com as
pernas. O gozo dela veio primeiro, forte e por instantes ela pensou que todas
as estrelas estavam ao seu redor... Estava toda molhada, seus fluidos íntimos escorriam
pelas coxas até o chão...
As estrelas ao seu redor... Um zumbido... Ela despertou do estado de relaxamento instantaneamente.
-Gerson... Gerson! Estou molhada! Devíamos ter ficado dentro
da casa, em cima da cama estaria seguro! Droga!
O vento que começara de repente já estava forte.
Numa fração de tempo todos do grupo já estavam junto deles
que se vestiram rápido enquanto observavam os arredores.
-De novo! Gritou Norberto! Bem, desta vez não fui eu falou
rindo e apontando para Julia, que ajeitava a calcinha enquanto saiam do lugar
rapidamente para descer novamente a encosta.
O lugar em que estavam parecia ter se tornado um campo de
estrelas. Não havia mata, a casa havia sumido bem como seus ocupantes. Algumas coisas estranhas flutuavam no céu, mas já eram conhecidas e pareciam inofensivas.Costumavam sumir logo.
III
Gods of the Valley Artista: Sandro Rybak (Germany) |
Gerson perguntou sobre as mochilas. Norberto respondeu:
-Pegamos todas é claro. Eu posso ser meio desligado, mas já
aprendi que aqui não podemos baixar muito a guarda. Que lugar maluco! Qualquer
coisa que saia dos nossos corpos faz mudar tudo! Eu peido e aparece uma cabana suíça.
A Julia trepa e o mundo vira um deserto sob a luz do Luar. O Marcos arrota
cerveja e começa a chover.
Continuou:
-Lembram-se daquela vez que o Luis não aguentou e foi dar
uma cagada na beira dos arbustos? Foi até engraçado quando a merda encostou no
chão e aquele monte de fadas luminosas surgiu, pena que botaram fogo em toda
mata e tivemos que pular do penhasco dentro daquele rio gelado.
Continuou:
-E aquela vez que algum alguém mijou nas pedras e apareceu
aquele rio com o cais? Acho que aquele vilarejo era muito doido mesmo. Onde
mais teria uma banda de rock progressivo tocando num bar de estilo rural no
meio das montanhas? Não descobrimos o nome, mas eu compraria todos discos deles com certeza. E a cerveja era muito boa também! Hahahahahah...
Gerson olhou para Julia e riram ambos.
-Bem - disse Gerson – pelo menos disto temos certeza. Nossos
excrementos e secreções naturais fazem as coisas por aqui mudarem. Engraçado e que as vezes não acontece nada. Já
tentamos orações, chamar demônios, seres espirituais, de tudo, mas parece que
nada do que sabemos de ocultismo e religião mudou alguma coisa.
Julia perguntou:
-Alguém aí conseguiu marcar o tempo? Quantos dias será que ficamos
naquela cabana? A barba do Norberto cresceu um pouco, acho que deve ter durado
uma semana. Que coisa, é sempre assim. Parece que estamos no reino das fadas
onde o tempo não corre.Nunca lembramos mesmo como chegamos aqui né? Acho que eu que estava no meu quarto fazendo algumas orações, mas não sei quando foi isto. O Marcos parece que lembra alguma coisa sobre estar na mata procurando algumas ervas, mas nunca fala nada.
Os demais fizeram silêncio e Julia percebeu que olhavam para
ela.
A mulher era o calendário natural. Tinha o ciclo da Lua
regulando seu corpo. Ela poderia saber.
Júlia olhou para todos, meio cabisbaixa se lembrando e
disse:
-Bem, eu sinto meu peito meio endurecido. Acho que ficamos
umas duas semanas por lá. Sei que parece ter sido apenas um dia. Bem, o que
quero dizer que é que acho que estou para menstruar de novo, já tenho algumas
cólicas. E se isto acontecer aqui neste lugar árido, sabe-se lá o que pode
aparecer. Lembram-se das borboletas carnívoras que nos perseguiram da outra
vez?
Ficaram quietos por um tempo, enquanto caminhavam. Logo
Gerson fez o grupo parar, numa área mais abrigada.
-Bem, se a Julia vai menstruar a chance de que seu sangue, ao
tocar o chão, traga algo muito estranho é maior. Então, acho que vamos nós
mesmos provocar algo, que acham? Com sorte poderemos conseguir alguma coisa em
que possamos estar mais seguros do que este lugar aqui.
Todos se olharam por alguns instantes e se deram as mãos.
Gerson olhou para todos e olhou para Norberto que sacudia as
pernas.
Falou:
-Todos prontos para correr ou serem felizes algum tempo? Então vamos lá! Vamos tentar algo light quem sabe. Aproveitem para cuspir e Norberto: pode peidar!
-Todos prontos para correr ou serem felizes algum tempo? Então vamos lá! Vamos tentar algo light quem sabe. Aproveitem para cuspir e Norberto: pode peidar!
Alguns passos adiante e perceberam uma luz avermelhada na
encosta do lado direito.
Olharam e parecia que a terra estava se abrindo. Logo o
vento trouxe o calor da lava derretida que começou a sair pela abertura. O chão
tremia levemente.
Um zunido fez com que olhassem para cima. Alguma coisa
muito grande voava sobre eles.
Gerson avisou:
-Pessoal, desculpem, desta vez a falha foi minha e não do
Norberto. Esqueci que queijo picante com vinho me faz peidar deste jeito! Corram
que desta vez deu merda!
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