Reino Vindo
Márcio Chacon
Acordo com o barulho da televisão ligada. Levanto ainda com sono... Resultado de uma noite mal-dormida. Sei que não vou conseguir pregar meus olhos tão cedo... Principalmente depois de ontem. Se Hugo descobrir que fui o responsável pela merda que aconteceu estou morto em menos de 24 horas.
Antes de desligar a TV meu telefone toca:
- Alô?
- Marcos... Sou eu.
- Ângelo? Não devia estar me ligando agora. Onde você está?
- Estou em casa.
- Devia estar cruzando a fronteira essa hora! O que houve?
- Não sei bem. Desde que cheguei ontem de noite... Tem dois carros parados em frente a minha casa.
- E qual é o problema?
- Bem... Hoje acordei bem cedo e então quando olhei pela janela... Eles continuavam lá. Aquilo me apavorou, cara.
- Ângelo... Presta bem atenção. Se Hugo ou outra pessoa tivesse descoberto alguma coisa... Você já estaria morto.
- Eu sei, mas estou apavorado, cara.
Sento na cama e tento acalmar aquele homem:
- Está com o dinheiro?
- Claro que sim.
- Então escute. Pegue todo o dinheiro, chame um táxi e vá até a loja do seu irmão. Use o carro dele e deixe a cidade. Só me ligue quando tiver cruzado a fronteira, entendeu?
- Está bem.
- Ângelo... Posso realmente contar contigo? É muito dinheiro.
- Sim, cara. Claro que sim.
- Estou falando de um reino. Seremos reis quando cruzarmos a fronteira. Teremos nosso próprio negócio, nossa própria polícia, nossa própria droga... Entendeu?
- Sim cara, mas quando acordei e vi os...
- Esquece isso, certo? Arrume tudo e faça o que mandei.
- Vai falar com Hugo mesmo, cara? Vai dizer que foi uma armação dos chineses? Que eles fugiram e levaram tudo depois do tiroteio?
- Sim. O Hugo odeia todos eles. Bastava apenas um motivo para iniciar uma guerra. Nós demos isso a ele.
- Cara... Desculpa. Fiquei realmente apavorado.
- Esquece. Ligue-me apenas quando estiver longe.
Desligo o telefone e procuro algo para me vestir. Não posso me preocupar com isso agora. Já está feito e tudo saiu como havia planejado. Poderia pegar as minhas coisas e sumir junto com Ângelo, mas isso ficaria muito na vista. Estragaria todo o meu plano. Hugo jamais vai saber de minha traição... Estará ocupado demais matando os chineses e procurando o dinheiro. Se eu seguir com o plano tudo vai dar certo. Procuro controlar a minha ansiedade, tomo meu café e então ligo para o homem que acabei de trair:
- Alô.
- Hugo... Sou eu.
- Como você está, Marcos?
- Bem. O que lhe contaram?
- Tudo.
- O que pretende fazer?
- O que devia ter feito há muito tempo. Exterminar todos aqueles chineses que andam pela minha cidade.
- O que quer que eu faça?
- Eu preciso de armas... Todas elas. Tem um Jaguar branco estacionado no shopping da cidade. Não tenho interesse no carro e sim no que está dentro do porta-malas, entendeu?
- Sim.
- Vá buscá-lo!
Desligo o telefone, saio de casa e tomo a direção das ruas... Tudo segue realmente como planejado. Ângelo já deve ter pegado o carro com o irmão e muito provavelmente já esteja longe daqui. Chego rapidamente no shopping. Entro no estacionamento vazio e de longe enxergo o lindo Jaguar. Poderia cruzar a fronteira com ele depois de entregar a encomenda de Hugo. Abro seu porta-malas e vejo duas pistolas e uma metralhadora... Pouca coisa para a guerra que Hugo tanto deseja. Entro no carro e ligo para Ângelo... O celular está desligado. Talvez tenha desligado quando estivesse passando por algum policial ou ficado sem sinal quando cruzou a fronteira. Talvez tenha ficado sem bateria. Não tenho tempo para pensar no pior... Todos os meus pensamentos são cessados quando dou a partida e o Jaguar explode. Hugo não teve a guerra que queria, mas conseguiu sua vingança. Matou o homem que o traiu. Eu morri naquela explosão sem conseguir nada. Talvez não devesse ter deixado Ângelo sozinho. Talvez não devesse ter aceitado buscar as armas, mas o diabo daquele Jaguar...
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