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Realmente É Uma Pena
Gilberto Strapazon
Gilberto Strapazon
Aquele padeiro tem alguma coisa de especial...
Eu me chamo Jack. É assim que todos me conhecem.
Desde pequeno sempre tive uma atração por culinária e nisto,
sou realmente muito bom.
Especialmente por pães. A massa crescendo, a textura ao ser
preparada, as cores que recebe ao ser assada e o resultado final, quando o pão
ainda quente é devorado pelas pessoas.
Observo cada um dos seus movimentos e sei exatamente como
elas são pela maneira que tratam o pão.
Muitos se importam apenas consigo e devoram sem o menor constrangimento.
São assim em tudo que fazem.
Outras são piedosas e fazem uma oração ou comem cada pedaço com
devoção como se fosse algo muito importante para o pão.
Aprendi estas coisas.
E descobri que nem sempre aquilo continuava depois da
refeição.
Ninguém deixa um único farelo cair no chão, pelo menos acho
que estão ficando educadas.
Muitas destas pessoas que parecem piedosas, logo passavam
sem hesitar por cima das pessoas, eram maus chefes ou colegas.
Os que se parecem egoístas às vezes são ótimos vizinhos.
Muitos participam em atividades voluntárias para ajudar os demais.
Interessante. O fermento que elas comem junto com a massa tem dado efeito.
Tenho estudado este fermento desde aquela primeira vez.
Foi fantástico.
E funciona muito bem. Sempre tem fila para pegar o pão recém-saído
do forno. Nunca sobra para colocar na prateleira.
Aprendi sobre fungos, sobre bactérias, as águas usadas, a
temperatura.
Fazer a massa com as mãos é uma experiência fascinante. As
mãos devem estar limpas, as unhas bem feitas.
Apenas o que eu colocar deve fazer parte da massa. Um
pequeno erro e os resultados serão imprevisíveis.
Observo o ciclo da Lua e até comprei uma grande fazenda com
uma parte da herança que me deixaram, só para poder encontrar alguns raros
tipos de cogumelos que ajudam na fermentação.
Pães exóticos, pessoas diferentes ou comuns. Tanto faz. São
todos parecidos de alguma maneira.
Ouvi um barulho lá fora. É cedo ainda e os fregueses sabem
que não devem aparecer aqui antes do pão sair do forno.
Saio pelos fundos, vejo a mulher caída no chão. Deve ter
desmaiado.
Não tem mais ninguém na rua.
Cabelos longos, corpo generoso. Carrego-a nos braços para
dentro.
Bonita, deve ter orgulho de seus traços.
Faço uma rápida inspeção por baixo de suas roupas.
Parece estar bem, está limpa pelo menos.
Os olhos estão ficando cinza. A respiração rápida mostra que
ela está a um bom tempo sem comer sequer um pedaço de pão.
Elas parecem demorar a entender que precisam ter uma vida
regrada.
É uma pena. Ficam bonitas e deixam tudo para sair pela
noite, andam por aí.
Mas tudo tem um tempo certo.
Coloco minhas luvas, não quero contaminar a massa crua que
está crescendo.
Preparo uma porção especial, com alguns grãos a mais do cogumelo
que cultivo na fazenda. O crescimento é muito mais rápido que o da massa
normal. As cores são sempre fantásticas, mas tenho trabalho a fazer.
Pego uma minúscula porção da massa que cresce rapidamente e toco
nos lábios dela. Em alguns segundos eles mudam de cor, ficam mais vivos, ela
suspira. Logo a boca se abre e engole a massa crua que já havia triplicado de
tamanho no contato com a mucosa da boca.
Asso rapidamente a porção que fiz em separado enquanto tiro
a roupa dela. Às vezes penso que deveria gostar disto, mas trabalho é trabalho.
Ela fez uma tatuagem na virilha.
Tiro o pão assado do forno. É bem fino, como o dedo de uma
moça e o comprimento vai do queixo ao sexo da mulher.
Ela está acordando e coloco o assado já morno entre seus
seios.
Demoraram uns dois segundos até ela perceber o calor na sua
pele. Os olhos se abriram com de um sono profundo, suas pernas roçaram uma contra
a outra.
A massa estava se unindo a pele dela.
Ela gemia enquanto os olhos gradualmente ficavam mais claros
e brilhantes.
Admirei por um instante a cena, mas já estou acostumado com
isto.
Logo mais ela vai esquecer-se do que houve e vai estar na
fila do pão junto com os demais fregueses. Todos os dias.
Espero que desta vez aprenda um pouco mais sobre viver em
sociedade e cuidar de si mesma.
Acho que as coisas vão bem. Gosto de fazer pão.
E os fregueses nunca vão muito longe.
Todos sabem que pão é o primeiro e principal alimento para
todos.
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